Eu me encontrei com Jonathan Blow em uma noite enevoada de segunda-feira em um café de São Francisco. Ele estava com um bom humor excepcional, mas por que não estaria? O resto do mundo ainda não sabia, mas ele estava para revelar um novo trailer e uma data de lançamento para The Witness: um projeto de paixão no qual ele investiu não apenas os últimos cinco anos, mas a totalidade de uma pequena fortuna que ele conquistou com o sucesso do seu jogo de 2010, Braid.
Eu passei duas semanas me preparando para o nosso encontro jogando e completando o game – uma versão alfa que ainda não tinha todos os ajustes, mas que já apresentava todo o conteúdo. The Witness apresenta diferentes tipos de provações com as quais os jogadores já devem estar acostumados: não há tutoriais ou dicas, ele não dá pistas e nunca segura na mão do jogador. Nessa ilha, a inteligência do jogador não só é respeitada como testada e desafiada regularmente.
Tendo jogado algo em torno de 50 horas (eu solucionei 388 dos mais de 600 puzzles do jogo e vi o final do game) em duas semanas, eu recentemente me vi imaginando puzzles nas paredes e no chão, parando mais vezes do que é conveniente pra traçar linhas entre eles na minha cabeça. Para Jonathan, esse fenômeno é bem familiar:
“Em certo ponto, está tão profundo ali que você não vê mais. É assim que esses jogos são pra mim. Braid era um jogo menor e mais simples – havia uma ou duas sensações explícitas que eram novas quando eu comecei a trabalhar nele. A sensação de mexer com o tempo e ter um grau de manipulação sobre as coisas, que provavelmente ficou bastante na minha cabeça enquanto eu trabalhava no jogo, e então, em algum ponto isso simplesmente se internalizou.”
“The Witness tem muitas coisas diferentes, então o processo leva mais tempo. É realmente esquisito – eu tenho, eu acho, quase 100% de sonhos com videogames. É difícil dizer, porque eu nunca me lembro deles, a não ser que eu acorde no meio ou tente lembrar deles logo de manhã, mas eu não faço isso muito frequentemente por algum motivo. Geralmente, eles nao são especificamente sobre o jogo no qual eu estou trabalhando na época, geralmente eles são mais subliminares do que isso: eu estou jogando algum jogo ou eu estou em algum mundo de jogo que é muito diferente daquele no qual estou trabalhando. Mas geralmente há alguma relação com o tipo de design no qual estou trabalhando. É interessante.”
A simples, por vezes complexa, beleza da enorme ilha de The Witness esconde dezenas de puzzles complexos e, às vezes, aparentemente intransponíveis. Eu joguei por 50 horas e terminei o jogo, mas apenas arranhei a superfície dos segredos mais profundos dessa ilha. Jonathan estima, na verdade, que os jogadores podem esperar cerca de 100 horas de jogo para completá-lo 100%. Não é uma experiência qualquer.
Quando perguntado se certos puzzles, áreas ou ideias foram considerados difíceis demais e cortados para favorecer uma experiência mais acessível, Blow não hesita:
“Não. Geralmente, se eu corto coisas é apenas porque eu não acho que elas são muito boas. Eu cortei centenas de coisas do jogo. Geralmente eu as corto cedo – eu começo a experimentat com alguma coisa e decido que eu não gosto dela. Mas há pelo menos um puzzle no jogo atualmente que quase ninguém – tipo 1% dos jogadores – vai conseguir solucionar.”
A direção de arte em The Witness é especialmente digna de nota. Renegando fotorrealismo em favor de alto contraste e cores vibrantes, o design visual casa com o jogo em maneiras significativas e deliberadas.
“O jogo, na parte temática, é sobre clareza,” elabora Blow. “É sobre entender o mundo claramente. Conservação da atenção é parte do estilo de arte. Se algo chama a sua atenção, é melhor que seja importante. As pessoas não estão acostumadas a pensar assim! Eu tive que treinar os artistas durante os primeiros anos em que eles estavam trabalhando no jogo: ‘Isso parece bem legal, mas não faz nada, então não pode parecer tão legal. Não pode entrar no palco e pgar a atenção de todo mundo; tem que ficar de fundo.’”
Continuando sobre a parte da clareza, mistério e design deliberado, The Witness é frequentemente mencionado no mesmo contexto que o reverenciado – mas notoriamente difícil – clássico dos anos 90 Myst. Blow aceita abertamente as comparações:
“Myst é definitivamente uma inspiração em termos de estado de espírito. Ele tem algo de intangível. Obviamente a ambientação é bastante similar — há uma ilha, você está sozinho nela, e há puzzles. Desde o primeiro dia eu pensava ‘Okay, você está fazendo Myst, mas com sensibilidades de design modernas.’ Houve vários jogos como Myst no passado, mas eu não acho que eu tenha jogado uma homenagem a Myst antes.”
“Em certo momento, porém, The Witness se torna algo bem próprio. Claro, você está nessa ilha, mas a ilha é bem maior do que a ilha em Myst, e ela dá uma sensação diferente. Eu, na verdade, pego muitas das coisas dos jogos de aventura que acontecem na era de Myst como antiexemplos: você nunca vai entrar em uma sala onde tem uma máquina cheia de botões, você não sabe o que eles fazem, alguns deles nem são interativos porque fazem parte do background, e você simplesmente clica por ali até que algo se mova. Isso era muito comum naqueles dias, mas desde o início eu decidi que não faríamos isso.”
“Mas parte da razão por que eu posso ter esse tipo de reação às coisas que eu não gosto nos games daquela era é porque eles mapearam aquele espaço. Se eles não tivessem vindo antes de nós, nós não teríamos aquele ponto de referência. Mesmo se eu pegar coisas de Myst e dizer que eu não gosto delas, isso tem que ser um ‘Eu não gosto delas’ respeitoso, porque estamos construindo sobre aquilo que eles fizeram.”
Realmente, The Witness evoca memórias de antecessores em seu gênero, mas não demora muito para começar a forjar seu próprio caminho. A ilha nunca para de ser misteriosa, mas quanto mais você explora, mais você vai começar a entender a maneira como as coisas são projetadas, para prever como um conjunto de puzzles pode se comportar e evoluir.
The Witness é uma relação subconsciente entre criador e jogador; uma arte simbiótica. É uma mensagem – não uma frase ou passagem a ser comunicada, ponderada e esquecida, mas a semente de uma ideia que tem o objetivo de crescer por dias ou até semanas e por fim trazer a audiência pra perto de seus arquitetos.
Quando perguntado diretamente sobre o que ele quer que o jogador tire de The Witness quando o jogarem, Blow é franco e esperançoso:
“É tão grande e complicado… Eles podem tirar o que quiserem, honestamente. O design do jogo diz respeito a dar as pessoas a liberdade de se aproximar dele de sua própria maneira. Eu falei de algumas coisas temáticas e sobre o que o jogo é, e o quanto as pessoas vão sacar disso vai variar de pessoa para pessoa, e isso é ótimo. Que tipos de puzzles as pessoas gostam vai variar também, e isso é ótimo.”
It’s so big and complicated… they can take away what they want, honestly. The design of the game is about giving people the freedom to approach it in their own way. I’ve spoken of some thematic things and what the game is about, and to what degree people get that will differ from person to person, and that’s totally cool. Which types of puzzles people like is going to be different, and that’s totally cool.
“Mas eu acho que há um certo sabor que o jogo tem que vai chegar às pessoas na maior parte do tempo, e isso é muito interessante. É difícil pra mim verbalizar o que isso é – é algo sobre a comunicação não-verbal e sobre explorar o mundo livremente, e ter essa experiência de epifania de novo e de novo, na qual você vai de não entender para entender, repetindo isso de novo e de novo.”
“Eu espero que a maioria das pessoas entendam uma porção razoável disso e entendam sobre o que é o jogo, mas na condição de designer você precisa entender que as pessoas vão ter as experiências que tiverem.
I hope most people get some reasonable portion of that and understand that that’s what the game is about, but as a designer you need to understand that people are going to have the experience they’re going to have. O seu papel como designer é dar oportunidades a elas; você não pode forçar as pessoas a ter uma experiência, certo? Isso não funciona bem. Então, é isso que eu tenho feito: tentando bastante colocar muitas experiências no jogo. Você tenta projetá-las para que elas se desdobrem da melhor maneira possível o tempo todo, e isso é algo muito desafiador de se fazer. É isso que faz do design de games algo interessante pra mim, ser algo tão desafiador.”
The Witness foi originalmente anunciado em 2009, mas apareceu mesmo no radar dos gamers quando foi mostrado durante o evento de anúncio do PlayStation 4 em fevereiro de 2013. Blow está liderando uma pequena equipe chamada Thekla em seu desenvolvimento, mas ele toma cuidado de não cair na armadilha de lançar um jogo antes que ele esteja pronto:
“Eu quero fazer o melhor jogo possível, o que provavelmente significa não apressar as coisas, certo? Apressar quase nunca melhora as coisas. Mas falando do ponto de vista financeiro, há todo tipo de jogos lançados que tinham ideias realmente muito legais, mas que não conseguiram ser todas feitas dentro de um prazo ou orçamento. Se você realmente quer se diferenciar e ser um jogo que as pessoas querem jogar, uma forma de fazer isso é manter sua integridade, se esforçar e fazer tudo o que você tinha pensado originalmente.”
“Se você for a eventos como GDC, você verá as pessoas falando coisas como ‘Oh, nós tínhamos todas essas ambições, mas então diminuímos o escopo’. Isso é muito comum, mas eu não queria fazer isso. Eu queria fazer o melhor jogo que pudesse. Isso significa que seria mais custoso, mas espero que isso signifique que mais pessoas vão querer jogá-lo. Eu preciso ser capaz de chegar nas pessoas honestamente e dizer ‘Esse jogo vale o seu tempo’, e é mais fácil dizer isso se eu tiver trabalhado o mais duro possível para torná-lo bom.”
Quando perguntado se ele sentiu que ele e sua equipe alcançaram esse objetivo, ele pareceu confiante.
“É o melhor jogo que eu sei como fazer atualmente. Ele levou minhas habilidades de design ao limite, ele melhorou minhas habilidades de organização… É um jogo muito complicado com muitas coisas nele, e elas não são coisas independentes. Elas todas fazem referências umas às outras e trabalham em conjunto, então você não pode simplesmente trabalhar em uma de cada vez. Mas, sim – é a melhor coisa que eu já fiz e isso é tudo o que você pode querer, certo? Eu espero que o meu próximo projeto também seja a melhor coisa que eu já fiz, mas por hora, é esse.”
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