Do pincel à lâmina: o processo da arte conceitual de Ghost of Tsushima

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Do pincel à lâmina:  o processo da arte conceitual de Ghost of Tsushima

Criando os personagens, ambientes e a identidade visual de um épico samurai.

Oi! Meu nome é Ian Jun Wei Chiew, Lead Concept Artist da Sucker Punch Productions, e tive sorte o bastante de ter trabalhado em Ghost of Tsushima desde o início. Ghost of Tsushima se passa em 1274, durante o período Kamakura, que traz muitas mudanças e oportunidades para explorar o design visual do jogo.

A nossa inspiração principal para a história foi a invasão Mongol do Japão em 1274, e o personagem principal é um sobrevivente dessa invasão, que vai contra todos para defender sua terra natal. Esta é a fantasia principal que serviu de guia para todos no estúdio. Começamos a nos expor a todas as pesquisas de conteúdo sobre a era Kamakura, cultura japonesa, filmes de samurai e a invasão de Tsushima, o que nos levou ao design final dos nossos personagens, trajes, ambientes, arquitetura, etc. Muitas das referências que obtivemos foram de museus e fotos tiradas por equipes enviadas até Tsushima e as ilhas principais do Japão. 

Personagens

Passamos muito tempo obtendo materiais de referência para os nossos personagens, de filmes de Samurai e livros online até exposições de museu, armaduras detalhadas dos samurais e até os trapos dos bandidos. Geralmente o conceito para os personagens é finalizado bem antes dos atores serem escolhidos. Tentamos evocar uma personalidade digna dos personagens nos rostos, além de providenciar referências para o tom geral que queremos transmitir. Isto ajuda na hora de encontrar atores depois. Uma vez contratados, encaixamos seus rostos nos designs dos trajes, e então eles fazem um ótimo trabalho captando a personalidade e nuances do personagem do seu jeito. O processo geral foi de dar uma breve narrativa do personagem, obter referências e pesquisas, criar alguns esboços, depois algumas rodadas de iterações e alterações para eliminar qualquer problema técnico que encontrávamos. 

Jin e Seus Aliados

No início dos esboços de Jin, sabíamos que precisaríamos de alguém que se encaixasse na fantasia de se esconder nas sombras, mas que ainda tivesse um visual inspirado por sua armadura e estética samurai. Embora existam assassinos furtivos que aparecem em vários pontos da história, não havia muita informação sobre o primeiro guerreiro deste tipo. Saber que queríamos um personagem que abandonasse a tradição e evoluísse para algo diferente por necessidade nos deu a oportunidade de contar a história fictícia de um novo tipo de guerreiro. Evitamos o caminho tradicional de assassinos icônicos, vestidos de preto com panos e incorporamos um toque de elementos de armaduras samurais nos trajes do Ghost para ajudar a dar um senso de realismo. O arco onde Jin se transforma de um samurai honrável em um guerreiro sem honra foi mostrado com a inclusão sutil de padrões, além de pedaços de armadura para tornar o traje do Ghost mais crível para a época.

Para os trajes mais tradicionais de samurai de Jin, olhamos de perto para referências de armaduras das eras Kamakura e Heian. Eles irradiavam um senso de realeza, que se encaixa com o arco de Jin, e contrastava bem com o esquema de cores mudas e escuras da armadura do Ghost. Começamos com Jin como um samurai completo, depois como um samurai quebrado, até renascer como o Ghost. As formas grandes e angulares da armadura tradicional dos samurai contrastava bem com a composição mais ágil e leve da armadura do Ghost. 

Também criamos uma linha de trajes que Jin pudesse adquirir durante sua jornada, e para esses, tínhamos um pouco mais de liberdade criativa em seu design, ajudando a vender a fantasia do samurai, com a armadura de Tadayori, inspirada pelos Yabusume (arqueiros montados tradicionais japoneses). Os trajes com mais pano e menos placas, como o Kensei e o Traveler foram criados com a intenção de fazer o jogador se sentir como um ronin andarilho, assim como nos antigos filmes de samurai. Como o vento tem um papel enorme no nosso jogo, nos certificamos de que todas as partes dos trajes reagissem com ele, como capas e capuzes. isso ajuda a deixar os personagens mais conectados com o mundo. 

Passamos pelo mesmo processo com nossos outros personagens primários e secundários. Muitos detalhes e imaginação entraram em cada personagem secundário, assim como para o elenco principal. Dos padrões ornados da armadura de Shimura até o cachecol de Yuriko, que indica sua memória se esvaíndo.

Khotun Khan & Seu Exército

Khotun Khan é um líder inteligente e impiedoso, e foi importante que mostrássemos tudo isso em seu design, além de sua força ameaçadora, contrastando com os samurais mais ordenados e restritos. O Khan possui dois trajes. Um possui uma paleta de cores mais tradicional, com estética orgânica, e o outro, mais defensivo, não possui cor alguma, com padrões mais angulares e opressivos. O exército Mongol consiste de cinco tribos, e tínhamos que diferenciá-las pelas ilhas e atos do jogo. Quanto mais poderosa a tribo, mais armaduras e peles vestiam. isto mostra a força do inimigo conforme joga, além de considerar as temperaturas frias da área de Kamiagata, conforme chega mais perto do fim do jogo. Dentro destes ranks há várias classes, cada uma com uma silhueta geral que com sorte pode ser distinguida à distância, como o arqueiro com formas mais triangulares, enquanto os brutos possuem uma forma mais retangular.  

Ambientes

Antes de mais nada, queríamos criar um jogo visualmente incrível, e quando trabalhamos com um contexto histórico pode ser difícil encontrar o equilíbrio correto, sempre tínhamos que pensar no que seria historicamente correto, e quando podíamos inventar. ‘Realista’ não é uma palavra que gostamos de usar, o nosso objetivo foi garantir que o jogo possuísse um senso de estilo, mesmo sendo um épico histórico. Queríamos criar um mundo que parecesse o Japão do ano 1274, mas ao mesmo tempo fosse mais expressivo. Isto veio de várias formas, como em escolhas fortes de cores, temas contrastantes nos ambientes, cenas impressionantes para o jogador encontrar, etc. Em geral, o que acaba no jogo é uma versão mais contida da arte conceitual, então foi importante sempre trabalhar nos temas e cores da fase conceitual para serem mais evidentes no jogo final. 

Pesquisamos muito sobre a arquitetura para criar o jogo, das fazendas até as cidades, castelos e santuários. Muitas das referências disponíveis online são de períodos mais recentes, e não haviam muitos do Japan Studio, além de experts da cultura durante a produção. O estilo arquitetônico Yayoi da região de Toyotama no game era único, e quase nunca era visto em outras mídias. Parece bem estranho, antigo, e historicamente funciona bem, já que é de antes de 1274. 

Após criar regras definidas para a arquitetura, usamos isso para criar os temas das cidades, como a cidade medicinal de Akashima, o esconderijo Straw Hats de Umugi, e as termas de Hiyoshi, para listar apenas alguns. Em geral, começamos a conceitualizar uma cidade pelo tema narrativo, juntando referências e quadros de ambientação que mostrassem esses temas, depois começamos a trabalhar no visual geral e das missões.

Vamos dar uma olhada no início do desenvolvimento de Akashima como exemplo. Sabíamos que queríamos uma cidade que representasse a cura, com um senso de mistério em sua identidade. Começamos a pensar e ir atrás de referências de medicina tradicional japonesa, além de vilas e pequenas cidades rurais, para então criar o layout e as iterações do conceito visual. Queríamos que a cidade parecesse ter gerações de ensinamentos sendo passados, em um ambiente de paz e serenidade, mas ao mesmo tempo misterioso. Conseguimos isso com itens e decorações que evocassem essas sensações, como as estátuas, o papel nas paredes, o chão de pedra branca, as gaiolas, a névoa durante o dia, e ter a plantação de repolhos como parte da cidade. Tudo isso ajudou a enfatizar o tema das cores lavadas e misteriosas, tornando a cidade um local memorável e diferente de outras partes do jogo.

Pudemos ser bem criativos e expressivos com as idéias dos biomas, já que, na maioria dos casos, são apenas visuais mesmo. A equipe de conceito e ambientação se uniu para ter idéias que ajudassem cada cidade a parecer única pela ilha. Isto envolveu usar os elementos principais dos biomas ao máximo, enquanto reduziam outros aspectos menos importantes. Isso ajuda a tornar um bioma mais marcante visualmente, ajudando a diferenciá-los. O objetivo aqui foi usar arte expressiva, não imitar como pareceria no mundo real.

A arquitetura mongol e alguns aspectos do jogo mostram áreas ocupadas, consistindo primariamente de yurts tradicionais, além de sinais de destruição. Fazendas e campos de batalha são onde a maioria dos temas dos Mongóis aparecem, e quisemos mostrar a opressão à população de Tsushima, junto com a destruição da arquitetura japonesa. Exemplos seriam a grama pisoteada, plantações de arroz arruinadas, e prédios japoneses destruídos. A maioria dos assets mongóis consiste de estruturas de madeira, peles e bandeiras. Isto cria ma forte diferenciação quando você encontra uma área ocupada e uma intocada. 

Identidade Visual

Logo no início, já sabíamos que queríamos uma estética mais moderna e clássica, em vez de manter tudo no tradicional. Antigos pôsteres de filmes de samurai e design gráfico moderno serviram de inspiração. Incorporamos este visual na nossa UI, logotipos, cenas em 2D, e até no nosso merchandising e material de marketing. Abaixo temos alguns exemplos de capa do livro, além da sequência de créditos.

As nossas cenas com tinta em 2D foram um aspecto divertido do jogo. Fugimos um pouco do visual tradicional sumi-e e usamos um visual mais agressivo. Com menos bordas e tinta fina, mais contraste, e marcas de pincel. Começamos recebendo a narrativa e o script, depois usamos um storyboard, pintando cada quadro, e por último enviamos para a animação e pós-produção.

Conclusão

A arte conceitual é apenas uma parte do processo de desenvolvimento, que começa bem no início. Quando criamos o look de Ghost of Tsushima, trabalhamos junto com artistas de vários departamentos para realizar a nossa visão unificada. Realizar esta visão foi um trabalho em equipe, com o talento de equipes de personagens em 3D, ambientes, texturas, iluminação, tecnologia, designers, animadores, UI, efeitos visuais e mais.  

Espero que tenham curtido esta pequena mostra de como a equipe ajudou a visualizar o nosso mundo de Tsushima!

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